Sob a fachada de uma atuação cooperativa, a Coopanest-DF — Cooperativa dos Médicos Anestesiologistas do Distrito Federal — operava, segundo investigações em curso, um sistema rigidamente hierarquizado que impunha práticas questionáveis de subordinação econômica e profissional a médicos recém-ingressos na especialidade.
Documentos e testemunhos obtidos no âmbito da Operação Toque de Midaz, deflagrada pela Polícia Civil e pelo Ministério Público do Distrito Federal, revelam que profissionais considerados “não sócios” — comumente apelidados de “bagres” — eram submetidos a um modelo de remuneração drasticamente inferior ao valor real gerado por seus serviços prestados. Em alguns casos, mesmo procedimentos que faturavam até R$ 30 mil para a cooperativa resultavam em pagamentos de apenas R$ 1,2 mil para o anestesista executor.
A distinção entre sócios-majoritários e minoritários estabelecia não apenas diferenças salariais, mas também um bloqueio ao acesso a melhores condições de trabalho e reconhecimento profissional. Os chamados “bagres” eram responsáveis por plantões noturnos, fins de semana e cirurgias de alta complexidade — sempre recebendo valores fixos por hora, sem direito à divisão proporcional dos lucros.
Apesar do cenário de exploração, havia um caminho possível de ascensão dentro do grupo, ainda que condicionado ao pagamento de cifras elevadas. Para se tornar sócio-majoritário, um anestesista precisava atuar entre três a cinco anos como colaborador e, então, desembolsar entre R$ 1,8 milhão e R$ 3 milhões — valor variável conforme o hospital de atuação e seu faturamento mensal.
Esse sistema de acesso ao núcleo decisório e financeiro da cooperativa também excluía, de forma sistemática, profissionais do sexo feminino e favorecia aqueles que aceitavam os plantões mais exigentes, mantendo os sócios afastados das escalas mais pesadas.
As denúncias culminaram na abertura de inquérito e na execução de mandados de busca e apreensão contra anestesiologistas e dirigentes da cooperativa, investigados por possíveis práticas de cartelização, organização criminosa, constrangimento ilegal e lavagem de dinheiro.
Em nota oficial, a Coopanest-DF rechaçou as acusações e afirmou que não há qualquer irregularidade em sua estrutura ou funcionamento. A instituição declarou, ainda, manter um compromisso ético com seus cooperados ao longo de seus mais de 40 anos de atuação.
A apuração dos fatos segue em curso e poderá redefinir os limites éticos e legais na organização da medicina cooperada no país.