O Código Civil do Brasil, implementado em 2002, está prestes a sofrer a sua maior revisão em mais de vinte anos. Um projeto de lei elaborado por um grupo de juristas e enviado ao Senado neste mês sugere modificações em várias áreas da vida, desde o nascimento até a morte.
As sugestões, porém, geram controvérsias. No que diz respeito à paternidade e à herança, por exemplo, enquanto alguns especialistas consideram a atualização indispensável e oportuna, outros críticos do texto expressam preocupações sobre possíveis retrocessos.
O projeto de lei sugere a modificação ou anulação de 897 artigos, representando quase metade dos 2.063 que regulamentam os direitos dos cidadãos atualmente, além da adição de mais de 200 novos dispositivos.
Segundo os juristas, algumas das inovações foram viáveis para refletir as mudanças sociais e tecnológicas desde a última edição.
O reconhecimento da paternidade configura um dos principais debates resultantes da nova proposta, que determina que o homem apontado pela mãe como pai de uma criança deve fazer o registro do filho ou realizar um exame de DNA.
Se o suposto pai se recusar ou não se manifestar, o oficial do registro civil deverá adicionar seu nome ao documento, enviando uma cópia da certidão da criança.
O projeto não define um prazo para que o pai se manifeste e apenas prevê a judicialização do processo caso o homem não possa ser encontrado. Conforme o texto, "a qualquer momento, o pai poderá solicitar a remoção do seu nome do registro, mediante comprovação da falta de vínculo genético ou afetivo".
Dessa forma, a proposta do Código Civil altera a responsabilidade pela apresentação de provas. Hoje, cabe à mãe recorrer à Justiça para validar a paternidade e confirmar que o homem indicado por ela é realmente o pai da criança.
O desafio de “procurar”
Dados da Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-Brasil) revelam que, entre os mais de 25 milhões de nascimentos registrados entre 2016 e 2025, cerca de 1,4 milhão não apresenta o nome do pai na certidão.
Desses casos, somente 18% tiveram a paternidade reconhecida posteriormente.
No Brasil, existem também muitos pedidos para a investigação de paternidade nos tribunais. Informações do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mostram que, desde 2020, o país recebeu mais de 493 mil novos processos. O maior número de solicitações ocorreu em 2023, quando quase 106 mil brasileiros buscaram esse direito.
A assistente social Carla Patrícia dos Santos, de 53 anos, compartilha que sua filha, atualmente com 36 anos, é uma das brasileiras que não possui o nome do pai na certidão de nascimento.
Ela enfrentou durante a adolescência a situação difícil de ser deixada grávida pelo seu então namorado, que sequer conheceu a criança.