O que era para ser uma reestruturação judicial se transformou em um verdadeiro campo de batalha bilionário no coração do agronegócio mato-grossense. A recuperação judicial do Grupo Safras, gigante cerealista controlada pelo ex-prefeito de Sorriso Dilceu Rossatto e Pedro Moraes Filho, acaba de sofrer um golpe devastador que expõe um cenário de caos e incerteza para centenas de credores.
A mais recente reviravolta veio pelas mãos da poderosa família Locks, sócia da bilionária Agropecuária Locks e herdeira do império Amaggi. Liderados por Itamar Locks e seu filho Samuel Maggi Locks, a companhia não hesitou em acionar a Justiça e, munida de uma decisão favorável da desembargadora Marilsen Andrade Addario, do TJ-MT, partiu para a "tomada" de ativos do Grupo Safras.
A ação drástica da família Locks, ao lado do produtor Celso Izidoro Vigolo, ambos credores da cerealista, escancara as graves irregularidades apontadas no processo de recuperação judicial. A alegação de ausência de documentos cruciais para a continuidade do processo de proteção judicial foi o gatilho para a decisão que pode selar o destino do Grupo Safras.
O resultado prático dessa decisão judicial foi imediato e impactante: a Agropecuária Locks, com R$ 6 milhões a receber, não perdeu tempo e invadiu uma das propriedades rurais do grupo, confiscando colheitadeiras avaliadas em R$ 15 milhões. O escândalo ganha contornos ainda mais delicados com a informação de que uma dessas máquinas estava alienada ao Banco da John Deere, conforme apurou The AgriBiz.
O baque na Justiça pegou de surpresa os advogados do Grupo Safras, que tentavam desesperadamente costurar uma injeção de capital milionária através de um DIP (Debtor-in-Possession) junto a investidores da Faria Lima. O plano era utilizar esse financiamento para pagar adiantado produtores e tentar reativar as operações da companhia.
Agora, com a recuperação judicial revogada, a expectativa é de uma corrida desenfreada de cerca de 900 credores para reaver seus R$ 1,8 bilhão em dívidas. Bloqueios de contas e pedidos de arresto de grãos e bens devem se multiplicar, aprofundando a crise do grupo.
Em meio ao turbilhão, advogados do Grupo Safras estudam um recurso desesperado para tentar preservar os ativos e, de alguma forma, manter as características de uma recuperação judicial. Entre os maiores credores, a paranaense Flowinvest lidera com uma exposição de mais de R$ 300 milhões, seguida por gigantes como Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal. A situação se agrava com um passivo de R$ 150 milhões no mercado de capitais, referente a um CRA da Copagri, que tem como investidores Vectis e Itaú Asset.
A "tomada" de colheitadeiras pela família Locks é apenas o prenúncio de um embate judicial que promete ser longo e dramático, com consequências imprevisíveis para o futuro do Grupo Safras e para o cenário do agronegócio em Mato Grosso.