Quatro policiais militares da ROTAM foram denunciados pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso (MPMT) por envolvimento direto no assassinato do advogado Renato Nery, executado a tiros em julho do ano passado em Cuiabá. A denúncia, assinada pelo promotor Henrique Pugliesi, também abrange a morte de Walteir Lima Cabral e a tentativa de homicídio contra outras duas pessoas, em uma tentativa deliberada de forjar um confronto policial para encobrir o crime original.
Os militares Jorge Rodrigo Martins, Wailson Alessandro Medeiros Ramos, Wekcerlley Benevides de Oliveira e Leandro Cardoso são acusados de integrar um grupo de extermínio denominado “Gol Branco”, utilizado como meio para articulação criminosa. O nome fazia referência ao modelo de veículo usado nas operações ilegais e aparece em conversas de WhatsApp entre os envolvidos. Eles foram denunciados por homicídio qualificado, tentativa de homicídio, organização criminosa, obstrução da justiça, falsidade ideológica, porte ilegal de arma de fogo e abuso de autoridade.
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As investigações apontam que os policiais simularam um confronto para ocultar a arma usada na execução de Nery, além de terem alterado a cena de um segundo crime, ocorrido seis dias depois, para inserir a pistola usada no assassinato em um contexto forjado. A mesma arma uma pistola Glock 9mm, número de série VPL521, de uso da Polícia Militar — foi encontrada junto às vítimas do falso confronto, levantando suspeitas que motivaram a investigação.
Segundo o MP, a execução de Nery foi encomendada por Cesar Sechi e Julinere Goulart, presos como mandantes do crime, motivado por uma disputa de terras avaliada em mais de R$ 40 milhões. Eles integravam o “núcleo de comando”, enquanto os PMs formavam o “núcleo de obstrução”. O policial Heron Teixeira, também investigado, teria intermediado o contato entre os mandantes e o executor.
A denúncia revela ainda que os PMs manipularam versões oficiais dos fatos, coordenando depoimentos com base em um boletim de ocorrência forjado. Mensagens de áudio mostram a preocupação com divergências nas narrativas e indicam naturalização da violência letal por parte dos militares. “Sempre conforme o B.O., entendeu? Dá uma olhada de novo”, diz um dos áudios usados como prova. Outro trecho demonstra tentativa de uniformização: “Deve tá dando divergência em nosso depoimento”.
Apesar da gravidade dos crimes, os quatro militares foram soltos no final de maio por decisão do juiz Francisco Ney Gaiva, da 14ª Vara Criminal de Cuiabá. A liberdade foi concedida mediante medidas cautelares, como apresentação de relatórios de trabalho, recolhimento domiciliar noturno e proibição de contato com testemunhas. Na justificativa, o magistrado alegou que “não há fato novo” que justifique a manutenção da prisão.
Contudo, o promotor Henrique Pugliesi argumentou o contrário ao solicitar a prisão preventiva dos acusados, destacando novos elementos, como áudios comprometedores e o uso do aparato estatal para encobrir crimes graves. O caso se soma à Operação Simulacrum, que já havia investigado a atuação de grupos de extermínio compostos por agentes da segurança pública em Mato Grosso.
A denúncia reacende o debate sobre o uso da força policial no Estado e os limites éticos da atuação militar. Para o Ministério Público, o episódio revela desvio grave de conduta e uso do poder público como instrumento de execução ilegal, ferindo a confiança da sociedade nas instituições. A Justiça ainda deve avaliar o novo pedido de prisão à luz das evidências apresentadas.