Após denúncias de irregularidades, fraudes e até de "escárnio", o magistrado Márcio Aparecido Guedes declarou a falência da AFG Brasil S/A, localizada em Cuiabá (MT), ao verificar o constante não cumprimento das obrigações estabelecidas no Plano de Recuperação Judicial (PRJ), aprovado em 2022.
O objetivo do processo era reestruturar R$ 648 milhões em dívidas, visando a continuidade das operações da empresa, envolvendo credores de várias partes do país.
Desde o ano anterior, o Olhar Jurídico tem relatado as queixas feitas pelos credores da companhia e até do Ministério Público, especialmente no que diz respeito à venda da Fazenda São Paulo, avaliada em 17 milhões de dólares.
A decisão foi anunciada na quarta-feira (23), após contribuições do Ministério Público Estadual e da Administradora Judicial, Zapaz, que indicaram a falta de pagamentos estipulados no plano, a não entrega de documentos contábeis desde julho de 2024 e uma queda de 99,9% na receita da empresa.
Além disso, o relatório da administradora judicial revelou que não existem registros de atividades empresariais normais desde outubro de 2022.
Com vários credores solicitando a falência, a Zapaz também admitiu que a tentativa de recuperação econômico-financeira não teve sucesso.
Para ilustrar, a Zapaz apontou que em 2020, ano em que a recuperação foi solicitada, a AFG obteve um faturamento que superou R$ 1 bilhão. Entretanto, em 2023, último ano contabilizado, a receita foi de R$ 1,5 milhão, indicando uma diminuição de 99,9%.
Além disso, há o desrespeito contínuo das obrigações acordadas no plano, o acentuado declínio financeiro, os atrasos no pagamento dos funcionários e a evidente falta de atividade empresarial, evidenciada pela inexistência de novos contratos e pela não emissão de notas fiscais.
O aspecto mais impactante da decisão judicial foi impulsionado pela manifestação de credores como Nova Aliança Agro Ltda., Anglopar Agro Ltda. e a Família Schwartz.
Em um documento enviado ao tribunal, os credores afirmaram que "o presente feito tem sido, em suas palavras, convertido em objeto de zombaria, ante o deliberado descumprimento do plano aprovado".
Essa acusação foi acompanhada por um pedido formal de falência, com base no artigo 73, inciso IV, da Lei nº 11.101/2005, que determina a conversão em falência em caso de descumprimento das obrigações assumidas no plano de recuperação, uma situação verificada neste caso.
O juiz ressaltou que "a preservação sem o cumprimento de sua função social apenas impõe ônus exacerbado aos credores" e concluiu que a AFG Brasil não conseguiu demonstrar viabilidade econômica para permanecer em recuperação.
A tentativa da empresa de convocar uma nova Assembleia Geral de Credores (AGC) já para 2025 foi negada por falta de base legal e por ser considerada, segundo a decisão, uma "medida meramente protelatória".
O plano aprovado estipulava um período de carência de 20 meses para credores de quatro categorias, com pagamentos programados em 15 parcelas anuais e um desconto de 70%.
Para a categoria I (trabalhadores), os pagamentos deveriam ter início em dezembro de 2022. No entanto, até a data da decisão judicial, nenhuma das obrigações estabelecidas havia sido comprovada como cumprida.
Ainda em 2024, durante o processo de recuperação, foi determinado que os bens da empresa, incluindo a Fazenda São Paulo, fossem indisponibilizados. Em vista disso, o juiz decidiu pela falência da AFG.
O tribunal também autorizou o envio de ofícios a várias entidades, incluindo cortes, varas cíveis e o Ministério Público do Trabalho, além da divulgação de um edital com um prazo de 15 dias para inscrição de créditos.
Agora, o processo seguirá sob a jurisdição da falência, o que pode resultar em responsabilidade civil e penal para os gestores da AFG Brasil S/A, conforme solicitado pelos credores.
A AFG era uma empresa formada por capital totalmente brasileiro, atuando desde 2002 na venda de grãos, principalmente milho, soja e seus produtos derivados, e possuía uma infraestrutura de logística, escritórios e armazéns nos estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Paraná, São Paulo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.